12.20.2006

Por não estarem distraídos

Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que, por admiração, se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.
Clarice Lispector

11.23.2006

(A VISITA-Continuação...)

Eles eram assim, inconvenientes como todo bom parente que se preze. Haviam chegado há poucas horas e já se transformaram no pesadelo da pequena Clara, que se via imobilizada naquela sala, menor a cada segundo.
Chegava a noite e aquela visita parecia chegar ao fim, pelo menos era o que Clara queria. Foi quando a cozinheira avisou que o jantar estava servido. Todos da casa sentaram-se nos lugares de sempre. A madrinha sentou-se ao lado de Ivete e o padrinho, para o espanto de todos e horror da afilhada, sentou-se à cabeceira.
Como ousava?!
Com um peso no olhar, a mãe conteve a menina, que explodia de raiva e tristeza. A mãe também não gostara da atitude mal-educada do compadre, mas, como boa anfitriã, relevou a indelicadeza.
Todos comeram, ouvindo os conselhos dispensáveis do padrinho, que falava pelos cotovelos e causava náuseas na pequena.
Após o jantar, as visitas tomaram mais um cafezinho e despediram-se. A madrinha apertou forte as bochechas de Clara mais uma vez e o padrinho apenas estendeu a mão para dar-lhe a benção.
Clara ficou na varanda, vendo o carro sumir no horizonte: queria ter certeza de que haviam ido embora.
A mãe a chamou para dentro, queria evitar um resfriado – a menina sempre tinha o nariz escorrendo. Ao entrar, pediu a benção à mãe e foi deitar-se.
Ivete encontrou Clara já adormecida, à meia luz, abraçada ao retrato do pai. Beijou-lhe a face e em sua testa fez o sinal da cruz. Desligou a luz do abajur e deixou a porta entreaberta, permitindo que um feixe de luz iluminasse o leve sorriso que Clara inconscientemente ostentava.
O relógio já marcava 7 da manhã e a menina acordara imensamente alegre – havia tido um pesadelo à noite passada e estava feliz por tudo não ter passado de um sonho ruim.
Correu para a praia e, como de costume, rodopiava na areia com o cabelo no rosto. Usava sua saia rodada que rodava rodava com ela e com a brisa da praia. Parou de repente, meio tonta. Era a mãe que gritava seu nome. Lembrou-se do pesadelo que tivera. Clara deu as costas para a casa e caminhou em direção ao mar. A mãe continuava a chamar por ela, que se perdeu entre as ondas.

11.14.2006

A VISITA

Caminhava na ponta dos pés. Toda meiguice de menina. Sua saia rodada rodava ao sopro do vento e ela soltava gargalhadas, enquanto corria sem rumo pela praia, logo cedo.
Os pés, minúsculos, roçavam a areia, que lhe cobria o corpo inteiramente. Seus olhos negros, profundos, enchiam-se de lágrimas na tentativa de olhar o sol, que irradiava sublime aquela manhã. Definitivamente, acordara feliz.
Ouviu sua mãe a chamar. Correu em direção ao quintal, perdeu-se entre as roupas no varal e dançou um instante com elas. Podia sentir-se suspensa, como os lençóis que bailavam ao sopro da brisa.
A mãe gritou uma vez mais seu nome. O chão nunca pareceu fugir-lhe tanto. Deixando pra trás a leveza do momento, dirigiu-se à casa um tanto zangada: a mãe sempre interrompia sua abstração!
_ Mãe! Disse, com toda a birra de criança mimada.
A mãe a repreendeu com o olhar.
_ Venha tomar a benção de seus padrinhos!
Clara surpreendeu-se. Não via os padrinhos desde o batizado e, como na ocasião, era muito pequena, podia-se dizer que nem mesmo os conhecia. Não fazia questão de conhecê-los agora. Queria mesmo era correr pela praia ou entre os lençóis no varal. Perder-se de sua mãe, da casa, das obrigações com a família... E neste momento, dos padrinhos.
Não entendia por que tinha de ter tanta consideração com pessoas que nunca antes haviam dado notícias. E se acontecesse alguma coisa terrível com sua família? Onde estariam os padrinhos que, pela tradição, deveriam acolhê-la? Ficou extremamente zangada, entortando os lábios, como de costume. Tomou a benção e saiu de mansinho para seu quarto.
A irmã surgiu de repente e a mandou vestir o vestido cor-de-rosa.
_ Mamãe mandou! Falou com a autoridade de irmã mais velha.
Clara odiava o vestido cor-de-rosa. Odiava a cor, o vestido, o modo como ficava parecendo uma bonequinha de porcelana colocada na vitrine. Ela só queria correr pela areia, com sua saia rodada que rodava rodava rodava.
Ao voltar para a sala, encontrou a mãe e os padrinhos sentados a tomar o cafezinho-das-visitas. Ficou ao lado da mãe, o olhar baixo para não fitar aqueles seres estranhos que invadiam sua rotina sem ao menos pedir licença.
A madrinha, uma mulher gorda e sorridente, de bochechas rosadas de pó, caminhou em sua direção e a puxou para sentar-se em seu colo.
Quis, desesperadamente, fugir, mas a mulher a prendeu rapidamente entre seus braços. Não pôde fazer nada. Estava presa naquela teia de gordura e flacidez. Mostrava os dentes, amarelados pelo café, entre o riso solto e apertava forte as bochechas da menina, que via a irmã desdenhar da infame situação em que se encontrava.
A estranha elogiava-lhe o vestido cor-de-rosa e tecia comentários inoportunos sobre seu cabelo.
_ Mas este cabelo está precisando de uma hidratação! Veja como é seco de sol e mar! Ivete, não podes deixar a menina solta pela praia!
Como ousava dize tamanho absurdo?! Acabava de chagar e já se achava no direito de pôr o bedelho em todo o lugar!
A pequena Clara olhou para a mãe com os olhinhos cheios de cólera. A mãe retribuiu apenas com um sorriso amarelo, tentando disfarçar o desconforto.
Foi então que Judite, a cozinheira, adentrou à sala com uma bandeja de biscoitos. Clara pôde ver-se livre daqueles braços repugnantes, que se moviam agora em busca de comida.
Era horrível aquela visão! Podia ver o alimento dentro daquela boca imensa e as migalhas, que saltavam para fora dela, enquanto falava sem parar.
Nesse instante, o padrinho, que se mantinha quieto até então, começou uma peregrinação pela sala.
Era um homem pálido, magricela, com ar aristocrático. Olhava a casa, ao seu redor, com certa curiosidade, o que causava desconforto à família de Clara. Depois de algum tempo em silêncio, o homem com nariz empinado sentencia:
_ Esta casa precisa de uns reparos. Uma pintura aqui, uns retoques ali, nada que um homem de visão não possa resolver.
Clara deu um salto do sofá, mas a mãe a segurou firme, apertando seu braço como repreensão, antes que ela pudesse dizer o que estava entalado em sua garganta. Aquele homem detestável atrevia-se ao ponto de achar-se o dono daquele lar, talvez até de tomar aquela pequena família como sua e ser o “homem da casa”! Ninguém jamais tomaria o lugar do pai, falecido havia um ano. A cabeceira da mesa permanecia imaculada, sua presença era ainda viva demais naquele lugar e assim seria pra sempre, pensava Clara.
(Continua...)

10.30.2006

Para Ana Paula

Ana Paula, certa vez, me contava sobre suas estripulias de menina de Açailândia. Fiquei encantada com o saudosismo que havia em suas palavras.
A menina da rodoviária

Gostava de encontros e despedidas. Por isso ia sempre à rodoviária. A mãe inúmeras vezes brigava com a menina, tinha medo de, algum dia, entrar num ônibus e perder-se em outras rodoviárias.
Catarina vivia ali, no meio de desconhecidos, vindos de perto e de longe. Era um lugar sujo e fedia a maior parte do tempo a frango e fritura. Somente de manhã bem cedo o aroma era agradável. As moças do café preparavam uma bebida bem forte, que exalava pela rodoviária inteira, e enrolavam o beijú de tapioca com coco, que dava água na boca em todos que passavam por lá nesse horário. Era realmente uma delícia as manhãs na rodoviária de Açailândia.
Quando chovia, as goteiras tornavam o ambiente ainda mais decadente. As pessoas se espremiam umas contra as outras nos poucos espaços secos que havia. E a piçarra vermelha que rodeava a velha rodoviária se transformava em um lamaçal escarlate, que coloria a paisagem cinza de Açailândia, nos dias de chuva.
As crianças corriam e esbarravam nas bagagens e caixas, espalhadas pelo chão. Riam e choravam a cada reencontro e a cada triste despedida. Os olhinhos mergulhados em lagoas salgadas que sucumbiam ao adeus ou até logo de familiares e amigos. Elas só extravasavam o que as gentes grandes teimavam em abafar pelas plataformas da rodoviária.
Catarina fez muitos amigos ali. Pessoas que revia uma vez ou outra quando, de passagem, saltavam na cidade. Outras, porém, nunca mais encontrou e deixaram apenas saudade na pequena viajante. “Pequena viajante”. Era assim que a chamavam, zombando de seu estranho prazer em perder horas a fio na rodoviária da cidade. Horas que eram marcadas por um grande, sujo e velho – como tudo ali, aliás! – relógio de parede. Pareciam correr lentamente aqueles ponteiros, tornando os dias naquele pedaço de Açailândia ainda mais enfadonhos.
Quando não chovia, o sol queimava de maneira impiedosa. Os velhos desfilavam com seus chapéus de palha e os mais jovens com bonés de algum candidato da última eleição. O suor escorria por seus rostos e corpos semicobertos. Os músculos se contorciam enquanto carregavam malas, caixas ou algum outro peso, em troca de centavos.
Apesar de tudo, a rodoviária era para Catarina um lugar mágico. Os mais incríveis espetáculos podiam se ver naquele lugar: a domadora de galinhas, o equilibrista (de malas)... Mas o que mais encantava Catarina eram os gritadores. "Teresina-Piauí, quem vai, quem vai?!", "Santa Inês, aqui, aqui!!". Funcionários das empresas rodoviárias que vendiam a gritos bilhetes de passagem, ou ainda homens que berravam na rodoviária em busca de passageiros para transporte alternativo. Lotavam ônibus, vans, paus-de-arara, todo e qualquer transporte.
Catarina sonhava um dia gritar assim também e encaminhar aquelas pessoas a seus destinos, quase como deus. Ficava encantada com aqueles homens, suas vozes fortes e poderosas. Não era só gritar, tinha a simpatia, as rimas, a entonação certa.
Queria mesmo entrar em cada ônibus que passava pela rodoviária e conhecer o mundo inteiro. Sonhava com este dia: sua mãe ficaria chorando e acenando da plataforma número 05. Ela seguiria estrada a fora, conversando com a senhora sentada ao seu lado. Logo depois de sonhar com tudo isso, olhava ao redor e lá estava ela, de volta à velha rodoviária de Açailândia. Temia nunca sair dali. Como sua mãe, que ainda esperava pelo marido, que um dia pegou o ônibus para a cidade grande, com a promessa de dar a ela e aos filhos uma vida melhor.
A menina crescia assim, ali, envolta em cheiro de frango e frituras, rodeada de homens suados e sem camisa, carregando peso, naquele lamaçal de janeiro-sangue, ouvindo gritos desesperados: São Luís, últimas vagas! Quem vai, quem vai?!
Foi ouvindo esses gritos que Catarina subiu no ônibus. Era fim de tarde, as luzes da cidade começavam a iluminar as ruas esburacadas e conferiam uma cor alaranjada à noite que chegava. A cidade estava um pouco vazia. Havia chovido aquele dia. A mãe e o irmão de Catarina acenavam para ela, que os via da janela. Viu sua mãe chorar um pouco, como em seus sonhos de menina. Sentiu um aperto no peito. Engraçado: sempre achou que sentiria um alívio ao deixar aquele lugar, a rodoviária, os homens suados, o odor de frango e frituras.
O ônibus começava a percorrer as ruas da cidade rumo à capital. Catarina via a paisagem, que aprendera a admirar, ficar para trás, como sua família e os pensamentos de menina. A pequena viajante já não era tão pequena assim, mas ainda guardava consigo alguns medos e questionamentos. O que haveria para além dos limites de Açailândia?
Não era uma senhora que viajava ao seu lado, mas um senhor de feição rabugenta, com que ela não iria se atrever a conversar. Ficou calada, vendo a rodoviária se distanciar cada vez mais. Tudo era despedida. Até a cidade parecia dizer: “Tchau, Catarina! Até!”.

10.11.2006

Tenho tido vontade de ler e reler certas linhas. Uma doce melancolia me invade meio sem porquê. Tenho tido momentos agradáveis que não explicariam essa sensação que me toma agora. Talvez seja só o meu eu dizendo que ainda é.
Foto: Rai
Intervenção: S.Q.C.
Um pedaço do Timor
UM DIA A MAIS

um dia a mais
quisera eu ter
para correr pelos campos
mergulhar nos mares da minha vida
e só então
depois
naufragar em alguma praia...
para sempre esquecida.

9.20.2006

Era sempre assim. Todo dia 19 o céu ficava cinza e melancolicamente chorava. Era um pranto bonito, apesar de triste. O tom de cinza não combinava com o vermelho-sangue (cor do 19). Não me perguntem o que isso significa! Ela, que era dona dos dias 19, tinha uma relação sinestésica com cores e números (com outras coisas também, talvez). Mas o cinza teimava em pincelar seu céu de 19. (Continua... Algum dia... Talvez no próximo dia 19.)

8.30.2006

Esquecer seria talvez uma maneira de mentir? Abstrair verdades e assim torná-las um não-acontecimento, algo que nunca existiu. Sei lá, sigo mesmo achando que é mentir o que se faz quando se esquece o que não se quer lembrar. Mentir verdades tortas e fazer delas tortas de mentiras (Rs). Deixa pra lá! Nem sei o que quero dizer...

eSQCiminto(?)

Voa palavra
encantada pelo tempo
perdida
esquecida
verso inacabado
palavra que não ouvi
não falei
voou
murmúrio
lamurioso esquecimento de mim.

8.24.2006

Prêmio Porta Curtas no Festival de Curtas de São Paulo 2006!!!

Através desse link, podemos assistir a 40 novos curtas-metragens brasileiros da seleção oficial do Festival de Curtas de São Paulo 2006. Os usuários do porta Curtas Petrobrás poderão votar nos filmes de sua preferência – os 3 mais votados receberão o prêmio Porta Curtas. Os filmes estarão disponíveis para streaming durante os dias do Festival - de 24 de agosto a 2 de setembro - e a votação online começa na noite de hoje, quinta-feira, 24 agosto. Abaixo, alguns curtas:

Ao norte

Alguma coisa assim




8.22.2006

Ontem choveu. Foi uma chuva bela e doída. Um lamento talvez.
Não há nada mais poético do que a chuva caindo por detrás da vidraça, construindo caminhos efêmeros. Então, vêm aquelas lembranças da infância, como um sonho, e você se vê em transe, anestesiada. É uma sensação única.

8.06.2006

A vida coagulando em minhas veias...

Este foi o primeiro texto postado neste blog. Quer dizer, uma parte dele apenas. Agora o mostro na íntegra.

Foto: eSQCer
Qual é o caminho que se pega quando não se tem aonde ir? Você diria qualquer um, mas eu respondo caminho algum. O melhor é não fazer nada. O silêncio talvez diga algo, quem sabe... Talvez ele só fique quieto, como todo silêncio. E ria, baixinho, do meu desespero, da minha impotência.
Como você. Que não entende minhas lágrimas sem sentido ou meu olhar perdido em algum canto da sala.
Quando é que vai amanhecer?
Ouço passos perdidos atrás da porta. São 2h da madrugada. Você perdeu a chave do quarto e eu não vou abrir. O lado de fora não me interessa mais.
Você bate na porta. Eu finjo que estou dormindo. Ouço sua respiração e percebo sua impaciência. Será uma longa madrugada...
Caminho até à porta e a divido com você. Cada um em seu universo paralelo.
Conversamos em nosso silêncio cotidiano.
Você está dormindo? Você sempre dorme quando tento conversar.
Estou cansada. Talvez não esteja aqui quando encontrar a chave da porta. Onde fica a saída de incêndio? Tem uma escada na janela. Você sabe que tenho medo de altura. Então, me pergunta o que quero afinal.
Quero voar com os pássaros por sobre a vida. Quero ver de longe o céu derramar seu pranto. E retornar, aliviada, para algum lugar que eu possa chamar de lar. Dentro de mim. Ser é tão vasto... Meu mundo é deveras imenso e não sei onde me esconder quando a angústia esmaga minhas cordas vocais.
Você ainda está lá fora. E já faz muito tempo que não diz nada. Eu sempre falo sozinha. As paredes parecem me esmagar aqui dentro. Você grita comigo, tentando me reanimar. E no delírio de minha tormenta, relembro uma vida que jaz em alguma esquina da cidade.
O vinho transborda e a taça, estraçalhada em pequenos cristais, rasga a mão trêmula que se banha num vermelho escarlate.
A mancha no chão é ainda vibrante como as cores de uma manhã ensolarada de verão, como a tela que pintei ontem com as cores do entardecer.

7.14.2006

Luiza e seus cacos de vidro

Os primeiros raios de sol entravam pela janela da sala sem pedir licença e o recinto foi se enchendo de uma manhã primaveril com cheiro de infância. Ela caminhava descalça pela casa e podia ouvir sua mãe dizer-lhe para calçar as sandálias. Riu da doce lembrança. A casa já não estava cheia de crianças correndo e gritando, nem de tias na cozinha fazendo o almoço. Agora, havia apenas Luiza e seus milhões de cacos de vidro.
Fazia vitrais. Dos mais diversos tipos e cores. Construía pedaços de vida, lembranças e sensações. Passava horas mergulhada num imenso mar-cristal, selecionando cada pedacinho de vidro, identificando sua origem, se eram de garrafas, de alguma taça ou de outros vitrais. Sim. Tinha de separá-los. Para talvez depois juntar tudo de novo. Mas agora sabia o que era o quê e qual a melhor forma de uni-los.
Não era um trabalho muito fácil, necessitava de paciência e olhar apurado. E isso Luiza tinha de sobra. Era muito observadora e o tempo parecia correr lentamente, dando a ela tempo de sobra para viver cada detalhe do dia.
Luiza colava os cacos como quem reconstruía vidas. Sentia-se poderosa. Mas ela não definia de imediato o que representaria o vitral. Não queria ser Deus. Ia acomodando os pedacinhos de garrafas, taças ou outros vitrais como se lhe faltasse a visão. Não gostava nem mesmo de imaginar no que aquilo poderia se transformar. Preferia caminhar no escuro, apalpando as paredes, mesmo que no final verificasse que o resultado deixou a desejar. Fazer o quê? É assim que as coisas são construídas no fim das contas. Além do mais, seus vitrais não eram meros pedaços quebrados de alguma coisa: eram sua vida, reconstruída a cada dia, com novas cores e texturas.
Luiza é como a primavera, que chega devagar, depois de uma longa estação fria e melancólica. E ocupa todo o espaço, trazendo flores e odores inebriantes. É como as margaridas em uma manhã ensolarada. E é na delicadeza de sua simplicidade que ela é incomparavelmente bela.
Cristalina Luiza. Tão delicada quanto seus vitrais. Tão frágil quanto a vida vista das janelas da sala-de-estar.

6.30.2006

No meio do caminho

Éramos três crianças perdidas na imensidão da noite. A lua iluminava nossos passos titubeantes. Eu quase caí e você me segurou tão forte que suas unhas ficaram cravadas em minha pele. Ela caminhava sempre na frente. Nunca olhava para trás, para nós. Mas você também olhava pouco pra mim, que estava há km de vocês. E assim íamos os três seguindo pela estrada sem acostamento. Cada um em sua faixa, respeitando os limites de cada linha traçada no asfalto. Chegamos a algum lugar chamado Paraíso. Havia pessoas nas calçadas de casas pequenas e engraçadas. Elas olhavam para nós, curiosas. Mas não havia nada de interessante para se descobrir ali. Éramos só crianças perdidas... Paraíso era um bom lugar para se viver, mas eles não queriam ficar. E ainda não era hora de nos separarmos. Então, seguimos mais uma vez pela estrada, mas agora era dia. Eu corri sem rumo, gritando muito. Os dois ficaram para trás. Juntos. Sentei mais adiante para esperá-los. Ela me olhou e disse alguma coisa que não entendi. Ela sempre dizia alguma coisa que eu não entendia. E eu nunca perguntava o que ela queria dizer. O gosto do asfalto quente estava impregnado em nossos hálitos. O sol escaldante nos trazia miragens de um provável fim de jornada. Mas ainda havia muito o que caminhar e a estrada a cada passo parecia prolongar-se um pouco mais. Paramos um instante na margem de um rio esquecido como nós. Já era noite e as luzes dos postes penetravam profundamente a água e, como grandes e radiantes pilares, pareciam sustentar aquele imenso rio. Faltava para nós pilares como aqueles. Faltava um pouco daquela luz para banir o breu de nossas noites melancólicas. Fogos despontaram no céu de repente. Ele nos pegou pelo braço e rodopiamos embriagados de sede. Três crianças em êxtase. Caímos na grama, exaustos, e contemplamos os pontos brilhantes que surgiam sobre nossas cabeças. Quando acordei, reparei na delicadeza com que ele a abraçava e no doce sorriso que ela estampava, como sempre desdenhando de minha fraqueza. Eles já estavam km à minha frente. E foi na bifurcação à diante que percebi que o meu caminho era o da esquerda. Não olhei para trás. Sigo em paz agora.

6.14.2006

DESCRIÇÃO

sou uma canção triste que faz alguém chorar
os sentimentos que essa canção faz despertar
o amor não correspondido
esforço não medido
alguém que vive a esperar

sou o desespero que leva à loucura
lágrima sempre tão pura
tristeza que leva à morte
contrário da sorte
sou do comercial... a censura

sou angústia... fraqueza
ferida que não cicatriza
sou o medo da vida
a esperança que vive perdida
sou o fracasso completo.

6.09.2006

Hoje fui assaltada. Foi tudo muito rápido. Levei uma pezada nas costas qua tá doendo até agora! É foda!!! Levaram tudo: documentos (todos!), grana (muita!), celular (que eu já queria trocar mesmo!) e meu óculos (tô ceguinha aqui!). Enfim, até a sorte tava falando sobre isso hoje por aí. Embora eu não acredite muito nessas coisas... Tá, eu só queria dizer pra vocês tomarem cuidado por aí. Principalmente se for cedo do dia. Não. Tomem cuidado em qualquer momento, onde estiverem. A gente nunca sabe quem tá sacando a gente por aí!

6.05.2006

Se...

Se eu tivesse a imensidão do mar...
Me perderia em meu pensamento, ouvindo o vai-e-vem das ondas... E naufragaria em solidão.


E se eu tivesse um céu cinza?
Escreveria uma poesia melancólica... Como todas as outras...

Se eu tivesse apenas um instante?
Faria dele eterno! Mas sei que, por mais que quisesse, ele seria pequeno demais para os meus anseios e, efêmero, acabaria antes mesmo de dizer-te o quanto te a...ah!


E se eu te desse a leveza de uma folha seca ao vento?

5.27.2006

Enquanto escrevo, a vida se desenrola lá fora e eu me perco um pouco mais aqui dentro. O papel é minha realidade e as linhas que rabisco, meu des(a)tino, traçado na incerteza que envolve a pontuação que vem a seguir.

5.21.2006

Perdas


seus olhos vermelhos sangraram minha existência hipócrita
e as palavras perderam o sentido quando te vi
pra que dizer o que nem sei se sei que você não vai ouvir?
ou entender melodias que não sei cantar
e te encantar não é mais que correr ao redor de si mesmo...
e desabar, tonta, em vão
no vão de algum corredor
onde a dor corre ao meu encontro
mais uma vez ouço um som
que é como a tormenta de dias sem cor
esquecidos como eu
gritos que quebram o meu silêncio mais profundo
pra que dizer as mesmas rimas
os mesmo versos e canções
já citados por alguém
e cair em clichês bobos?
de qualquer forma o maior clichê sou eu
o lugar-comum de todos os lugares banais
serei ininterruptamente redundante
batendo forte a cabeça na parede
rindo de minhas lágrimas
: é pra suavizar a minha dor

no varal ainda restam algumas lembranças
o reencontro é sempre um doce e doloroso adeus
despedidas geralmente me deprimem.

5.17.2006


Dolores
a dor me inspira me deixa mais bonita que de costume ardor nos momentos de ira e paixão a cor dos dias de chuva ou púrpura mancha que corrompe o tecido nunca antes molestado arpoador da minha melancolia ria ao me ver traçar essas linhas encorajadas por ti infame chaga que assola os puros de coração adorardoracorarpoador a...or... esqci.

5.06.2006

CotidiANAmente
Eu adorava ver o seu sorriso e o leve movimento de seus lábios me chamando de idiota. Você odiava a xícara de café esquecida na mesa da sala e como eu molhava todo o quarto depois do banho.
Eu amava aquela sua foto P&B ao lado da cama – seus olhos perdidos me deixavam inquieto imaginando no que estaria pensando.
Você gostava de me irritar falando alto ao telefone. Quanto constrangimento me causou por causa do seu ciúme sem razão – eu só via você! Mas ninguém disse que tínhamos de ser perfeitos...
Ainda sinto seu frescor nos lençóis, mas a cama está vazia. A música que ouço pela manhã não é mais o som da sua voz rouca sussurrando ao meu ouvido. Você não está mais nem ao lado da cama em tons de cinza.
Não há ninguém pra me xingar. Não com a sua delicadeza quase infantil. E eu não tenho me irritado com o barulho do telefone que tocava a todo instante. Porque agora o silêncio grita alto demais...

4.30.2006


Ela
Ela caminha como as ondas que se desmancham lentamente na praia e o seu olhar penetrante me asfixia como quando prendo a respiração para deter aquele soluço que me toma depois do almoço ela não tem definição poderia dizer que é o orvalho que me refresca e que seu sorriso inebriante estremece meus dedos que vivem no ímpeto de tocá-la mas é como a nuvem de fumaça do meu cigarro que ela tão logo se perde dos meus olhos ela é o câncer que maltrata meus pulmões o pesadelo que me tira o sono ela é a melodia da canção que compus depois de ver aquele trailer do cara caminhando na praia com capa de chuva ele também cantava pra uma garota e elas até se pareciam será que ele a conhece? não ela não é do tipo que dá trela pra qualquer um é por isso que até hoje eu não sei o nome dela.

4.28.2006


FILOSOFANDO
Só me vê
De verdade
Aquele que consegue
Ver a solidão
Por trás do meu
Sorriso
Aquele que
Me vê
E não me entende
Que procura
Compreender-me
E, logo em seguida,
Desiste...
Porque não adianta
Caminhar no escuro
Em meio
A espinhos...
Não acredite
Na minha
Alegria
Nem tampouco
Nas minhas
Lágrimas...
Meu espírito
Reflete a loucura
De um mundo
Que não me deseja
Apenas o silêncio
Se faz presente
Nos meus
Diálogos
E inúmeros
São os meus
Monólogos:
Pensamentos
E palavras
Que já nem eu
Suporto mais ouvir...
Essa é a
Filosofia
Da minha vida:
Um imenso
Vazio
Traduzido
Em palavras
Vãs...

4.26.2006

Poema para Clarice

QUERER MEU...
leve
como pétala
que baila ao sopro da brisa
que de tão leve
leva em si sorrisos
efêmeros lampejos de felicidade
branca
como as nuvens
numa bela manhã ensolarada de domingo
e como a paz
que habita as montanhas
longe
que de tão longe
não chegasse nunca
e o sonho
permaneceria
sonho
inalcançável
belo
que de tão belo
detalhes
perfeitos
meu
tão meu
que
esq(s)eria
clara
que de tão clara
Clarice.

4.24.2006

DE SACO CHEIO DO MUNDO

o mundo está cheio
de gente
com fome
com raiva
cansada
de saco cheio
de pedir
implorar
fugir
chorar
tudo corre rápido demais
não há mais tempo pra sorrir
nem pra ouvir a criança
(sem nome) que chora
pois o mundo está cheio
de censura
amargura
loucura
cheio de gente
que grita
em meio a uma multidão sem rosto
sem voz
há pessoas demais
poucas flores
o mundo está cheio
de cadáveres ambulantes
suplicando
pra que tudo seja como antes
lá fora
sinais de uma luta
Bandeira surrada
e o beco
só se vê o beco
pois o mundo está cheio
e eu
estou cheia do mundo
suas manias
paradigmas
perversões
há gente inventando
amores
flores
momentos nunca vividos
pra não morrer
de desilusão
psssiu!
eles não sabem
que são apenas fantasmas
esquecidos
mas o mundo está cheio
de “povo”
do povo que não é gente
dessa não-gente que é poeta
que ri pra não chorar
que não sabe o que é o amor
e mesmo assim morre de amar
o mundo está cheio
de ilusão
e eu
que estou cheia do mundo
sou apenas mais uma
grande interrogação.

4.19.2006

Boneca de Pano

Quando pequena tive muitos brinquedos. Alguns caros, outros nem tanto. Lembro, contudo de uma velha bonequinha de pano. Não era muito bonita, nem tampouco limpa, mas era uma boneca com cara de infância e exalava um gostoso perfume.
Tinha olhos que pareciam falar comigo. E ficavam tristes cada vez que ganhava um brinquedo novo.
Esquecia a pobrezinha algumas vezes – ficava de lado vendo-me crescer e esquecer cada vez mais dela. Mas permanecia ali, firme, à espera de um olhar sequer, de uma lembrança saudosa.
Lembro de uma canção que papai gostava de dedicar a mim. Sempre que ela tocava, papai, como que tentando trazer-me de volta à infância, colocava minha velha boneca de pano entre meus braços cruzados. Aquilo me fazia rir. Sentia mesmo saudade, mas não sei se de algo que realmente vivi ou se de alguma coisa que não permiti acontecer. E perdi... De alguma forma perdi a infância, que quase não lembro mais, que deixei passar rápido demais. E perdi o doce prazer de rir das coisas que não entendo, do vento que bagunça meus cabelos, das ondas do mar que fazem meus pés afundar na areia.
E minha velha boneca de pano ainda me espera, ansiosa, voltar para lhe tirar da caixa amarelada pelo tempo, onde guardo lembranças que-esqueci-de-lembrar. Ainda me espera para brincar de menina descalça e boneca despenteada na cama de papai.

4.17.2006

Textículos

VAZIO

Caí no imenso vazio do espaço sideral
E ele coube todo dentro de mim
Mas, se vazio é ausência, é nada
O que será essa totalidade que senti?

NATURALMENTE
um dia
veio o vento
levou o sorriso...
a chuva
camuflou o pranto
a dor se misturou
ao grito
a morte...
confundiu-se com o sono

_ e eu morri.

EFEMERIDADE
tão grande
é a efemeridade da vida
que ela passou por mim
e nem percebi
­_ quando vi
já estava morta.

MISTÉRIO
o que seria dos poetas
se não houvesse a lua
para lhes dar inspiração
em suas noites solitárias?!

4.14.2006

O Estranho

Em uma noite nada interessante, Antonia passeava, meio sem rumo, pelas velhas ruas da cidade, agitada pela música dos bares-cheios-de-artistas.
Sentou-se para escrever um poema, mas a noite não trazia inspiração. Foi quando avistou um velho homem, grande e inquieto. Ele andava para um lado e para o outro, ia e vinha, tal qual o pêndulo do relógio. Mas não marcava o tempo. Parecia que tinha todo o tempo do mundo – prova disso eram as marcas em seu rosto. Às vezes parava, observava. Sentia a música, que era tocada por dedos ágeis. E de novo saía em sua peregrinação rumo a lugar nenhum. Contudo, apesar de agitado, tinha o semblante sereno. Demonstrava ser um bom homem.
E era.
Era um professor, agora já aposentado, da velha escola na qual Antonia estudara. Há muito não o via e quando achou que não fosse reconhecê-la, caminhou em sua direção e sentou-se ao seu lado. Perguntou-lhe se estava triste. Apesar de estar, disse que não, pois ela também não sabia o motivo de tanta tristeza. Mas ele viu através de seus olhos alguma angústia. O estranho é que ela também percebeu algo obscuro em seu olhar.
Conversaram durante longas horas – mais ele com ela do que o contrário. E fez Antonia sorrir e refletir. Arrancou ainda algumas palavras de seu silêncio. Falaram sobre a antiga escola, contou-lhe histórias e estórias. Reviveram, enfim, o passado... Um passado de boas e más lembranças, como todo passado.
Ele era um adorável estranho conhecido. Conhecido o bastante para falar com ela, porém estranho o suficiente para ela contar-lhe seus segredos, apesar de tentar deixá-la à vontade para isso.
A noite começava a correr rápido demais a Antonia assustou-se ao perceber que já era tarde. Ofereceu ao velho professor um belo sorriso de gratidão, despediu-se e foi embora. Ele, por sua vez, permaneceu mais um tempo sentado na grande pedra que dividiam. Depois se levantou e continuou sua peregrinação pelas ruas mal-iluminadas.
No ônibus, de volta para casa, Antonia relembrava sua conversa com o estranho amigo. Ria discretamente, às vezes, e sentia uma imensa saudade de algo que desconhecia. Uma saudade tão imensa que lhe doía a alma.
Talvez não percebesse, mas um belo poema havia sido escrito naquela noite e aquela noite transbordava poesia. Um tipo de poesia que não cabe no papel. E Antonia estava repleta dela sem saber.

4.11.2006

...
Ele queria que ela fosse igual a ele. Ela tentou. Ele não gostou do que viu. Pra que desenhar metáforas, se as antíteses são o que lhes restam? Seus braços estão cansados de remar em vão (os dele ou os dela?). Alguém bate à porta. É hora de sair. É tempo de se deixar ir, dar voltas ao redor de si mesmo. O que há pra se descobrir? Ele queria se perder. Ela queria se encontrar. Duas crianças sem rumo. E acabaram ambos num silêncio de qualquer instante perdido. O vento ainda sustenta alguma melodia sussurrada. Até quando?
"E mais: não só inalcançável por ele mas por ela própria e pelo mundo. Ela vivia de um estreitamento no peito: a vida." (Clarice Lispector - Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres)

4.10.2006

O céu do Timor

Foto: Rai Castro
FUGA
O poema pousou na nuvem

e ela se desfez
em prantos
e rimou e(m)cantos
por onde pairou
pousou sobre a vida
viveu amores

vôou
conDORES
se perdeu no horizonte ao entardecer
e retornou ao que era
antes mesmo de ser
pensamento perdido
solto
sem rima
verso branco
como a nuvem desfeita
sombra do inexistente
poemaranhado de ilusões.

O sorriso é a expressão da alma, ou pelo menos um pouco disso...

Não sei como, mas isso aí em baixo virou música. Isso é o que acontece quando não se tem nada pra fazer!
Quando ela sorriu
Ela apenas sorriu
E o seu sorriso quebrou minha solidão
As portas do paraíso se abriram
E eu pude então ver o sol
Que há tempos de mim se escondia
Que não me permitia ver o mundo
Suas maravilhas
A vida aconteceu
Quando você apareceu
Nas entrelinhas escrevo
Um poema
Pra você
Lembra daquele dia
Em que fomos felizes?
Você estava linda
E eu era só eu
Imperfeito
Seu riso é o rio
Que corta as margens do meu papel
Quando você canta
A vida se encanta
E eu me perco mais em seus olhos
Onde foi que você me perdeu?
Não viu que eu era seu...
Ela apenas sorriu
E o mundo se desfez
Eu me perdi
Na embriaguez
De suas palavras
No leve toque de seus dedos
No suspiro que guarda
As horas amargas
No medo
Quando ela sorriu...

4.08.2006

Essa foto é em homenagem a Caramello e à toda a sua criatividade que transborda e nos enche de sensações ímpares. Lembra da cena dos pés (Antonia), Carol? Pra vc! Bj.

que lugar é esse
em que me encontro
que não me permite falar
onde meu pranto é contido
e ninguém compreende o que vejo
roubaram os versos
que enfeitavam minha doce melancolia
no vazio do silêncio acordei
entre soluços
segue a vida
que não sei viver
sonhar
ah... mar!
que me invade tão violentamente
e me tira o ar
e sufoco
mas que lugar é esse
que não sei se fico
ou se vou
que não sei se me leva
ou abandona
só queria meus versos
que se perderam
e me perdi
só queria...

sozinha.

4.07.2006

A vida coagulando em minhas veias...
Eu sinto saudade de coisas que nem sei... De pessoas queridas, momentos que não se repetirão jamais. Saudade do que perdi, do que não fiz ou não disse. De mim mesma... Do sentimento que impedi florescer, do amor que não deixei ser amado, da vida que deixei morrer. Eu sinto saudade até de quem nem sei se existe. Talvez seja alguém por quem espero. Alguém que existe apenas em mim.
...

Qual é o caminho que se pega quando não se tem aonde ir? Você diria qualquer um, mas eu respondo caminho algum. O melhor é não fazer nada. O silêncio talvez diga algo, quem sabe... Talvez ele só fique quieto, como todo silêncio. E ria, baixinho, do meu desespero, da minha impotência.
Quando é que vai amanhecer?
Quero voar com os pássaros por sobre a vida. Quero ver de longe o céu derramar seu pranto. E retornar, aliviada, para algum lugar que eu possa chamar de lar. Dentro de mim. Ser é tão vasto... Meu mundo é deveras imenso e não sei onde me esconder quando a angústia esmaga minhas cordas vocais. O vinho transborda e a taça, estraçalhada em pequenos cristais, rasga a mão trêmula que se banha num vermelho escarlate.
A mancha no chão é ainda vibrante como as cores de uma manhã ensolarada de verão, como a tela que pintei ontem com as cores do entardecer.
"A tinta ainda continua fresca em suas mãos, o chão continua molhado..." (Dos Santos).